sexta-feira, 3 de julho de 2009

O Período de Latência


Sigmund Freud escreveu que “o complexo de Édipo revela, de maneira crescente, sua significação como o fenômeno central do período sexual da primeira infância. Depois, já sepultado, sucumbe à repressão e é seguido pelo período de latência”. Após todos os intensos processos defensivos, a sexualidade infantil deixa de apresentar o manifesto vigoroso de antes e passa então a influenciar o psiquismo desde uma expressão latente e, portanto, através de outros expedientes (assim como o menino mantém uma fixação na imagem da mãe e depois descolada para outras mulheres).

Existe uma enorme onda de repressão sobre a criança e sua sexualidade, relação essa em que, consequentemente, é possível constatar “formações substitutas”. Como estas formações perten- cem ao inconsciente, elas serão sempre regidas pela égide da atemporalidade, podendo estar ati- vas constantemente. A sexualidade infantil teria deixado todas as representações psíquicas sujei- tas a resignificação. O conceito de Complexo de Édipo não pode ficar circunscrito a uma cronolo- gia. Este conceito nuclear da teoria psicanalítica designa uma estrutura de relações interpessoais em torno da qual se organizam as origens da religião, da moral, da sociedade, da ciência, da arte, enfim, de toda a cultura.

É importante ressaltar que a atividade dos impulsos sexuais infantis não cessa, mesmo durante este período de latência, embora sua energia seja desviada, no todo ou em grande parte, e dirigida para outras finalidades. Este processo de desvio das forças pulsionais sexuais para outros objetivos recebe o nome de sublimação.


ESPELHO E IDENTIFICAÇÃO

A médica e psicanalista, Françoise Dolto, já alertava para o fato de as meninas terem a espe- rança, através de sua mãe, de tornarem-se mulheres, desenvolvendo seios e estando aptas a trazer filhos ao mundo. O ingresso na “arena feminina” é orgulhosamente marcado através das palavras tranqüilizadoras da mãe. A menina tenderá a mostrar que seu desejo é identificar-se com o modelo feminino. O deslocamento inconsciente das pulsões vai em direção a um curioso acesso, ao domínio perfeito da linguagem, tomando como evidência que, normalmente, as garotas “falam pelos cotovelos”. Haverá também deslocamento ao domínio corporal, dando margem à competição feminina.

As meninas irão se cercar de amigas que, ao mesmo tempo, serão suas rivais. Não é raro observar os grupinhos de meninas em três ou outro número ímpar com constantes desavenças e rivalidades. “Uma sempre sobra”, dizia uma vez uma pequena paciente de 7 anos, referindo-se às dificuldades em lidar com suas decepções, inveja, vaidade e auto-estima.

A menina investe de amor fetichista em suas “bonecas humanas”. Com elas, pode desempenhar radicalmente seu papel maternal tutelar, que tende a tornar manifestas todas as fantasias narcísicas compensatórias de sua impotência.

Neste período da latência, que cronologicamente pode ser mais ou menos circunscrito dos 5 aos 11/12 anos, as meninas estão fora dos aniversários dos meninos e vice-versa. Na hora de cantar o parabéns, a célebre musiquinha “com quem será que fulaninho vai casar?”, é motivo de quase um desespero para o aniversariante, pois define uma escolha de objeto, no momento em que a criança está muito mais interessada no fortalecimento de sua identidade. Há a necessidade do reconhecimento pelos seus pares de ser bom em alguma coisa: um esporte, uma língua, uma disciplina, um instrumento, a capacidade argumentativa e assim por diante.

A princípio, para um adulto-observador, as meninas podem passar a impressão de que se incomodam menos do que os meninos com a brincadeira. Entretanto, uma vez que elas têm maior domínio da retórica e acesso à linguagem, desvencilham-se muito mais facilmente da “zoação”, (da brincadeira de ficar na berlinda para ser irritada pelos colegas) do que os meninos. De modo geral, elas deixam muito menos a perceber que foram atingidas pela provocação.



Revista PSIQUE

Ciência & Vida

EdIÇÃO 41

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